sexta-feira, 31 de maio de 2013

D'uma xícara de café - Parte I

PS: Porque eu preciso de um lugar para extravasar o meu romantismo invernal. Ah, esses ares frios!

Maria Lúcia, desde que se mudou para capital, não fez nenhum vínculo ou amizade que passasse do superficial comprimento, acompanhado de conversa sobre o clima, de fila da padaria ou de elevador. Típica interiorana, a moça era do tipo que adorava esticar uma prosa – principalmente quando esta era acompanhada de café fresquinho e bolo de fubá – mas sentia tremores só de pensar na possibilidade de abordar um desconhecido interessante com um assunto trivial. Contudo, fazia dois meses, e a presença da solidão aumentava à medida que o frescor dos novos ares diminuía.

Estudava de manhã, e a tarde ia do trabalho para casa e da casa para o trabalho. De domingo a domingo. Trazia para o apartamento, além de pãezinhos e outras guloseimas da loja, o aroma marcante da bebida impregnado no uniforme. Nos dias de lavar roupa, deixava a lavanderia do prédio cheirando a chocolate, caramelo ou canela. Era fácil descobrir os horários em que Maria Lúcia chegava e saía: bastava um olfato apurado o suficiente para notar o cheiro de café no elevador.

E foi pelo café que ele a conheceu.

O líquido fumegante, saído dos copos plásticos, subia para o teto em espirais de fumaça, envolvendo, em uma atmosfera fantasmagórica e etérea, o fluxo frenético de clientes. Com as palmas das mãos vermelhas devido ao carregar ininterrupto de bebidas escaldantes, Maria Lúcia concentrava-se na tarefa de equilibrar, mesmo vacilante, um círculo de canecas de cappuccinos em uma bandeja de metal, quando ele voltou do banheiro e sentou-se novamente na mesa. Não foi pela garçonete notado, mas provocou, em sua saída do toalhete, o estridente ranger das dobradiças enferrujadas, que tanto a irritava.

Com o indicador, ela envolveu a alça de uma das canecas, tendo o máximo de cuidado para não deixar o creme da superfície, coberto de gotas de chocolate, transbordar durante o percurso até a mesa. Mas no meio do trajeto, um pouco da espuma escapou da borda, escorreu pela xícara até o pires, deslizou a partir dele em linha reta e acabou por gotejar justamente nas páginas do livro em que ele estava.

Crucias para o entendimento do capítulo.

3 comentários:

  1. Gosto quando você utiliza elementos cotidianos, para escrever um conto repleto de sentimentos. Isso é realmente fantástico.

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  2. Ai que texto lindo, to adorando as coisas que você escreve, mas deu vontade de entrar dentro deste texto! (eu sempre falo isso quando eu realmente gosto do texto! haha)
    :*

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  3. Frio deixa a gente assim mesmo, né? IOHDAIDOIDA
    Mas que bonitinho! Curiosa o que virá a seguir, com o livro do moço e o creme da moça!
    Beijos :D

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